terça-feira, 27 de abril de 2010

" O vale das bonecas "

Subo todos os dias uma encosta do Casal Ventoso .
Acho que nunca subi a encosta para ir comprar produto . Só tenho a certeza disso , porque há dias em que o meu estado normal já parece que tenho quatro ou cinco broas no saco .
Agarro a pastinha, como se fosse uma executiva e apercebo-me de tudo a fugir . Os headphones ajudam a esquecer pombas tombadas pelo papel de alumínio numa pata desfeita pela narina adentro .Um estrépidoa furar o tímpano com o resgate a trazer asas á mata , de soslaio oiço


- Olha a dealer


(nunca me senti com a lata de quem transporta mais do que o afecto de algumas situações )


-A gaja vende


(eu só atentava se o pacote de pastilhas tridente me podia encher os bolsos com notas )


-Quem me dera , gritava eu ao longe , sem hipótese de ser agarrada por bracinhos que nem hemoglobina têm para apontar .


e lá ia a dealer a subir , suada pelos calcanhares , a engomar a camisola com o bafo das tardes sem regulação .
Uma tarde a meio da subida pelo vale , reparava numa palhota :

pneus de bicicletas sem hastes , guizos de vento encardido , papagaios de papel pendurados nos vôos de perímetro autorizado , bolas de lã velha , maços de mangas enxuvalhados à brutamontes , um suplício de redes e linhas , o subterfúgio de um homem barato mas alegre .
Cara de bexigas - loucas , as pústulas da varíola a servirem de estofo , á pele acima do sinal no nariz e

- As minhas meninas são tão lindas !!!!!


(eu a olhar desligada , sem notar muros a ofuscarem as meninas a brincarem aos sorrisos invisíveis )


-Não as vê?????????


-Não .


Ultimamente só tenho reparado em grinaldas de ouro falso, capelas descapotáveis e luzes de ofertórios a cada dia acintosos .


( o Papa vem aí é natural que a custo suporte todos os símbolos a ele inerentes )


A vendedora , parada a perscrutar


(quando não é o meu espanto é a minha euforia )


duas bonecas , cada uma na sua cadeirinha de praia , costas à militar , com medo de mim , risonhas da calvície ,bem tratadas ,uma com pó de arroz nas linhas que unidas formam rugas ,


enternecida


( a minha fase das bonecas foi tão perturbadora )


umas misses , unhas pintadas , etiquetas de Pai preocupado , quando ele falecer tenho a certeza que as suas meninas vão para um museu.Umas farripas de jornal numa , lavadinhas , não as larga .
Os sem - abrigo apegam-se sempre a qualquer coisa com um Amor que só Deus sabe justificar .
Vi-o a rapar uma lata de atum com uma educação de seda que me comoveu e



no dia seguinte não consegui aparecer de mãos a abanar , quando fui visitar as suas meninas .



beijos de Paz :P

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