quinta-feira, 21 de julho de 2011

" A Portugal "

" Esta é a ditosa pátria minha amada .Não.
Nem é ditosa ,porque o não merece.
Nem minha amada ,porque é só madrasta.
Nem pátria minha,porque eu não mereço
a pouca sorte de nascido nela .


Nada me prende ou liga a uma baixeza tanta
quanto esse arroto de passadas glórias.
Amigos meus mais caros tenho nela,
saudosamente nela, mas amigos são
por serem meus amigos , e mais nada.


Torpe dejecto de romano império;
babugem de invasões ; salsugem porca de esgoto atlântico ; irrisória face de lama
de cobiça, e de lieza,de mesquinhez ,de fátua ignorância;
terra de escravos,cu pró ar ouvindo ranger no nevoeiro
a nau do Encoberto ;
terra de funcionários e de prostitutas,
devotos todos do milagre,castos nas horas vagas de doença oculta ;
terra de heróis a peso de ouro e sangue,
e santos com balcão de secos e molhados no fundo da virtude ;
terra triste à luz do sol caiada , arrebicada , pulha , cheia de afáveis para os estrangeiros
que deixam moedas e transportam pulgas.
oh pulgas lusitanas pela Europa ;
terra de monumentos em que o povo
assina a merda e o seu anonimato
terra-museu em que se vive ainda,
com porcos pela rua ,em casa de celtiberas ;
terra de poetas tão sentimentais que o
cheiro de um sovaco os põe em transe ;
terra de pedras esburgadas , secas , como esses sentimentos
de oito séculos de roubos e patrões,
barões ou condes ;
ó terra de ninguém , ninguém , ninguém :
eu te pertenço .És cabra , és badalhoca,
és mais que cachorra pelo cio,
és peste e fome e guerra e dor de coração.
Eu te pertenço mas seres minha , não "



in poesia de Jorge de Sena (40 anos de servidão )

Faço suas as minhas palavras e note-se o registo actual deste seu poema escrito em 1961.Continuamos tão bananas e cús relaxados.

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